A VERDADE DO EVANGELHO
TEOLOGIA SISTEMÁTICA

Charles Finney

 

AULA 35

A PROVA DA PERSEVERANÇA DOS SANTOS

 

As seguintes considerações, tomadas em conjunto, me parecem estabelecer a verdade da doutrina em questão, fora de qualquer dúvida.

1. Deus já tomou as decisões cabíveis a res-. peito da salvação de todos os eleitos, desde a eternidade. Temos visto este assunto. Nenhum destes jamais se perderá. Estes foram dados a Cristo desde a eternidade, como uma semente que o servirá. Temos visto que a conversão, a perseverança e a salvação final dos eleitos são asseguradas. A sua conversão, perseverança e salvação são asseguradas por meio da graça de Deus em Cristo Jesus, prevalecendo através do Evangelho de modo a influenciar o livre-arbítrio dos eleitos, para fazer com que este resultado se cumpra. As instruções, promessas, ameaças, advertências e admoestações da Bíblia, com todas as influências pelas quais estão rodeadas, são os instrumentos pelos quais o Espírito Santo os converte, santifica e salva. A cada passo, como Fletcher ressalta, "a graça antecede o livre-arbítrio".

Primeiramente Deus se aproxima do pecador e se move a favor deste; mas não é o pecador que se aproxima, ou que se move, ou que procura fazer com que Deus se mova. Deus toma a primeira iniciativa e o pecador é quem se entrega. Deus chama e o pecador responde. O pecador jamais se aproximaria de Deus, se Deus não o houvesse atraído.

Novamente: Deus chama de modo eficaz, porém não irresistível, antes que o pecador se entregue. Este também não se entrega e responde a uma chamada suave. Alguns verdadeiramente esperam uma abordagem mais forte, esperam ser chamados com uma voz mais alta e por um espaço de tempo mais longo do que outros; todavia, ninguém de fato vem a Deus até que tenha sido efetivamente persuadido a fazê-lo; isto é, até que essa pessoa tenha sido de forma efetiva capturada de seus refúgios de mentiras e buscada de modo poderoso, não para forçar, mas para vencer a sua relutância ou o seu egocentrismo voluntário, e como para induzir essa pessoa a voltar-se a Deus e a crer em Cristo. Não há dúvida de que o pecador é totalmente não inclinado a obedecer até o exato momento em que é persuadido e induzido a render-se. O ato de voltar-se, como temos visto, é um ato de espontânea vontade, porém a pessoa é induzida a voltar-se através da ação do Espírito Santo.

Todo aquele que verdadeiramente já se converteu sabe que a sua conversão não deve ser atribuída a si mesmo, em qualquer outro sentido, a não ser que essa pessoa apenas finalmente consentiu, por ter sido levada e persuadida pelo Espírito Santo. A glória pertence a Deus pelo fato de o pecador possivelmente ter-se entregado, talvez, após uma longa resistência, e jamais depois que tenha sido tão convencido, de modo que tivesse ainda alguma escusa ou apologia a favor do pecado; não até que o Espírito, através da verdade, da argumentação, da persuasão o vencesse de modo justo, e o compelisse, sem forçá-lo a submeter-se. Esta é uma breve declaração dos fatos que estão ligados à conversão de cada alma que alguma vez se converteu a Deus. Este fato é verdadeiro em relação à conversão de todos os eleitos de Deus; e se outros, além dos eleitos, forem convertidos alguma vez, este é um verdadeiro relato de sua conversão.

Uma vez mais: o mesmo é verdadeiro quanto à perseverança do crente em santidade, em cada exemplo, em cada ato. Os santos perseveram, não em virtude de uma mudança de caráter constitucional, mas como resultado da influência permanente do Espírito Santo que habita dentro de cada um. "A graça que é dada gratuitamente vem sempre antes do livre-arbítrio"; isto é, a vontade jamais obedece, seja qual for a ocasião, nem sequer por um momento, exceto pelo modo como se persuade a fazê-lo, exatamente como no princípio. O trabalho iniciado pelo Espírito Santo não é levado a cabo, exceto se o mesmo Espírito continuar a trabalhar nos santos para que desejem fazer, e, de fato, façam a sua vontade. Os santos não começam pelo Espírito e então se tornam perfeitos através da carne ou por meio dela. Não existe nenhum exercício de santidade que não seja verdadeiramente imputado à graça e à influência do Espírito Santo, como a própria conversão. Não são os santos que se convertem a si mesmos, no sentido de que se voltam ou se entregam, até que sejam persuadidos pelo Espírito Santo. Deus os converte, no sentido de que Ele de modo eficaz os atrai ou os persuade. Os santos se voltam, no sentido de que essa volta seja um ato próprio de cada um. Deus os converte, no sentido de que Ele os induz ou produz a sua conversão. O mesmo é verdadeiro sobre toda a sua carreira de obediência nesta vida. Os santos se mantêm, no sentido de que toda a obediência é de sua responsabilidade; toda a sua piedade consiste na própria obediência voluntária; porém Deus os mantém, no sentido de que, a cada exemplo, e a cada momento de obediência, Ele os persuade, e os ilumina, e os impulsiona a tal ponto que Ele mesmo assegura a obediência voluntária de cada um; ou seja, Ele os impulsiona e os santos prosseguem. Ele persuade, e os santos se entregam às suas persuasões. Ele trabalha nos santos tanto o querer como o efetuar, e eles querem e efetuam. Deus sempre antecipa aos santos todos os exercícios de santidade e os persuade a levá-los adiante. Isto é tão abundantemente ensinado na Bíblia que citar os versículos das Escrituras seria um desperdício de seu tempo. Não se diz dos santos que são apenas convertidos, mas também santificados e guardados pelo poder de Deus.

Nenhum santo, então, guarda-se a si mesmo, exceto por ser guardado pela graça, pelo Espírito Santo e pelo poder de Deus. Não há, portanto, nenhuma esperança para qualquer santo e nenhuma razão para fazer cálculos sobre a salvação de qualquer pessoa, a menos que Deus evite que essa pessoa caia ou pereça. Todos aqueles que foram salvos, ou que ainda o serão, são, por este motivo, salvos por meio e através da graça que é dada gratuitamente, e que prevalece acima do livre-arbítrio, isto é, através da graça que é dada gratuitamente e que assegura a conformidade do livre-arbítrio. Isto Deus faz, e está certo de fazê-lo com todos os eleitos. Foi sob a condição da presciência do fato que Deus pôde, através da mais sábia administração de seu governo, assegurar o resultado de que estes foram eleitos para a salvação eterna através da santificação do Espírito e da crença na verdade. Agora observe como é que os eleitos são salvos. Todas as ameaças, admoestações e os ensinos da Bíblia são endereçados a eles, bem como a todas as outras pessoas. Se existiram santos, em quaisquer épocas, que não fizeram parte dos eleitos, a Bíblia não faz menção dessas pessoas em nenhuma de suas passagens. A Bíblia também não fala dessas pessoas, como menos ou mais seguras do que os eleitos.

Novamente, nenhuma passagem da Bíblia implica que alguém além dos eleitos seja convertido. Ela não descreve qualquer pessoa além dos eleitos, em qualquer ocasião, vindo a Cristo de coração - e em qualquer tempo sendo regenerados ou nascidos de Deus. Em nenhuma passagem a Bíblia reconhece duas classes de santos: os eleitos e os não eleitos. Porém, se existissem duas classes como estas, e se a salvação dos eleitos fosse garantida, como realmente o é, e a dos não eleitos não o fosse, seria inacreditável que a Bíblia não revelasse este fato.

Novamente, longe de a Bíblia reconhecer ou implicar tal distinção, na verdade implica o contrário em todas as passagens. Ela divide a humanidade em dois grupos, e em nada mais do que isso, apresentando-os como contrários entre si. Estes grupos são contrastados entre si através dos seguintes nomes: santo e pecador; povo de Deus e povo deste mundo; filhos de Deus e filhos deste mundo ou filhos do maligno; os eleitos e os réprobos, isto é, os escolhidos e os rejeitados; os santificados e os não santificados; os regenerados e os não regenerados; os penitentes e os impenitentes. Porém, sejam quais forem os nomes pelos quais são chamados, é manifesto que está sendo feita uma referência às mesmas classes e não a outras. Os "eleitos de Deus" é um nome comum para os santos ou o povo de Deus. Não posso encontrar na Bíblia nenhuma evidência de que alguém, além dos eleitos, alguma vez tenha sido convertido, ou alguém cuja salvação fosse certa além da salvação dos eleitos. Os eleitos são, ou serão, cada um daqueles certamente convertidos e salvos. Se alguém prefere contender que quaisquer outros serão convertidos, cabe a este o ônus da prova; que este o prove, se puder. Porém, deverá prová-lo para que possa estabelecer o fato de que quaisquer pessoas verdadeiramente regeneradas jamais estão perdidas, por ser certo que nenhum dos eleitos jamais será perdido. Contudo, uma vez que me cabe a afirmação, devo tomar o fardo de mostrar que ninguém, além dos eleitos, é reconhecido como santo nas Escrituras; e como estou falando somente da salvação dos santos, devo tomar como assegurado que todos aqueles que foram escolhidos desde a eternidade para a salvação eterna, através da santificação do Espírito e da crença na verdade, certamente serão salvos. Agora, se for possível provar que alguns santos foram de fato perdidos, seguir-se-á que alguns dos que não faziam parte dos eleitos foram convertidos. E, por outro lado, se puder ser demonstrado que nenhum santo jamais foi, ou será, finalmente perdido; mas, pelo contrário, que todos os verdadeiros santos são e serão salvos, seguir-se-á que nenhuma pessoa além dos eleitos se converterá. Pois todos aqueles que são ou ainda serão salvos, são salvos por Deus, e salvos de modo planejado, e de acordo com um plano eterno, e -- é claro -- foram eleitos para a salvação desde a eternidade.

Já tenho dito anteriormente ser inacreditável que a Bíblia devesse ser lida, como o é, não fazendo nenhuma distinção em suas passagens entre os santos eleitos e os santos não eleitos, se existisse de fato alguma distinção. Não pode ser dito com justiça que a Bíblia de modo proposital ocultaria de todos os santos o fato de sua eleição, sem que isto fosse para eles uma pedra de tropeço. O que temos visto não é o fato, mas, pelo contrário, que os eleitos, ao menos em alguns exemplos, tiveram o conhecimento de que foram eleitos. Todavia se diz que Pedro exorta os santos do seguinte modo: "procurai fazer cada vez mais firme a vossa vocação e eleição" (2 Pedro 1.10); a partir desta passagem alguns inferem que eles não sabiam que eram eleitos; e além do mais, que, embora fossem realmente santos, ao menos alguns dentre eles, contudo, não eram parte dos eleitos.

As palavras aqui referidas fazem parte da seguinte conexão: "Simão Pedro, servo e apóstolo de Jesus Cristo, aos que conosco alcançaram fé igualmente preciosa pela justiça do nosso Deus e Salvador Jesus Cristo: graça e paz vos sejam multiplicadas, pelo conhecimento de Deus e de Jesus, nosso Senhor. Visto como o seu divino poder nos deu tudo o que diz respeito à vida e piedade, pelo conhecimento daquele que nos chamou por sua glória e virtude, pelas quais ele nos tem dado grandíssimas e preciosas promessas, para que por elas fiqueis participantes da natureza divina, havendo escapado da corrupção, que, pela concupiscência, há no mundo, e vós também, pondo nisto mesmo toda a diligência, acrescentai à vossa fé a virtude, e à virtude, a ciência, e à ciência, a temperança, e à temperança, a paciência, e à paciência, a piedade, e à piedade, o amor fraternal, e ao amor fraternal, a caridade. Porque, se em vós houver e aumentarem estas coisas, não vos deixarão ociosos nem estéreis no conhecimento de nosso Senhor Jesus Cristo. Pois aquele em quem não há estas coisas é cego, nada vendo ao longe, havendo-se esquecido da purificação dos seus antigos pecados. Portanto, irmãos, procurai fazer cada vez mais firme a vossa vocação e eleição; porque, fazendo isto, nunca jamais tropeçareis" (2 Pe 1.1-10). Sobre esta passagem, observo o seguinte:

Que Pedro dirigiu esta epístola a todos aqueles que possuem fé, isto é, a todos os cristãos verdadeiros, conforme se vê desde o primeiro verso. Ele não a endereçou nominalmente a alguém, porém deixou-a a cada um para que tivesse a certeza de que tem fé. Então Pedro passa a exortá-los a crescer na graça, assegurando-lhes que se alguém não o estivesse fazendo, seria por ter esquecido que os seus pecados anteriores foram perdoados; isto é, se a alguém faltasse aquilo que Pedro estava ordenando, estaria provado que essa pessoa não possuía a verdadeira fé, ou que estaria desviada.

Então Pedro acrescenta, conforme o décimo verso: "Portanto, irmãos, procurai fazer cada vez mais firme a vossa vocação e eleição; porque, fazendo isto, nunca jamais tropeçareis". O apóstolo assume plenamente o seguinte:

(1) Que os chamados e eleitos serão salvos; fazer a sua chamada e eleição garantidas era o mesmo que assegurar a sua salvação deles;

(2) Que ninguém mais é salvo além dos chamados e eleitos, pois se outros fossem salvos não seria em conseqüência de serem ou não chamados ou eleitos, como condição de serem salvos, e

(3) Que ele não considerou a ninguém como cristão, ou como em qualquer época tendo verdadeira fé, além dos chamados e eleitos; pois não estava exortando a supostos pecadores impenitentes a tornarem-se cristãos, mas a supostos cristãos a que tivessem a certeza de sua chamada e eleição. Isto mostra que Pedro considerou a todos os cristãos como parte dos chamados e eleitos. Terem a certeza de sua chamada e eleição era estar seguros da sua salvação. Certamente o apóstolo não tinha a intenção de exortá-los a tornarem-se participantes do grupo dos eleitos, pois, como já vimos, este número foi estabelecido na eternidade; mas pela diligência e pelo crescimento na graça, para lhes assegurar a salvação, ou deste modo provar ou demonstrar a sua chamada e eleição. O apóstolo queria, também, admoestá-los, pois, embora chamados e eleitos, a sua suprema salvação ainda estaria condicionada ao seu diligente crescimento na graça e à sua perseverança em santidade até o final da vida de cada um. Ele portanto os exorta a fazer com que a sua chamada e eleição estejam seguras. Isto implica o mesmo que assegurar a salvação de cada um. Pedro se refere à chamada e à eleição como sendo indissoluvelmente ligadas. Afinal, a chamada eficaz resulta da eleição, ou a eleição resulta da chamada? Já vimos que a eleição é eterna; portanto, a eleição não pode ser o resultado da chamada, mas a chamada deve resultar da eleição.

Novamente, cristãos e santos, bem como os filhos e o povo de Deus, os discípulos de Cristo e os eleitos são, de modo evidente, considerados pela Bíblia como um todo, como sendo uma mesma classe.

Uma vez mais, Cristo diz: "Tudo o que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora. E a vontade do Pai, que me enviou, é esta: que nenhum de todos aqueles que me deu se perca, mas que o ressuscite no último Dia" (Jo 6.37,39).

Nesta passagem Jesus diz que todos aqueles que o Pai lhe deu virão a Ele e que é da vontade do Pai que não perca nenhum, mas sim que ressuscite a todos (isto é, para a vida eterna) no último dia. Cristo não está dizendo que ninguém vem a Ele se não for dado pelo Pai, porém este fato está plenamente implícito, pois diz: "Tudo o que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora". O que o Senhor quer dizer quando fala em não lançá-los fora está claro no verso 39: "E a vontade do Pai, que me enviou, é esta: que nenhum de todos aqueles que me deu se perca". Então a expressão não lançá-los fora significa que Cristo sem dúvida os salvaria, isto é, salvaria a todos aqueles que a Ele viessem. Porém, se Ele os salva, devem obrigatória-

mente ter sido dados a Cristo e sido eleitos, caso contrário não seriam salvos. Se não forem eleitos, ou dados a Cristo pelo Pai, jamais serão salvos, a menos que alguns sejam salvos sem que estejam incluídos no plano de Deus, ou sem que tenham sido escolhidos para a salvação. Se alguém é salvo, é Deus quem o salva através de Cristo, ou por Cristo. Se Ele o salva, o faz de modo planejado, e não sem qualquer desígnio. Porém, se planeja ou deseja planejar algo, Ele já o planejou desde a eternidade. Então, nos parece claro que todos aqueles que vêm a Cristo foram a Ele dados pelo Pai; e que Ele não perderá a nenhum desses, mas sim os ressuscitará no último dia. O meu propósito no presente, contudo, não é insistir em que nenhum daqueles que vêm a Cristo se perderá, mas somente que todos aqueles que vêm a Cristo fazem parte do número dos que a Ele foram dados pelo Pai, ou são parte dos eleitos.

Compare novamente: "Tudo o que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora. E a vontade do Pai, que me enviou, é esta: que nenhum de todos aqueles que me deu se perca, mas que o ressuscite no último Dia. Ninguém pode vir a mim, se o Pai, que me enviou, o não trouxer; e eu o ressuscitarei no último Dia. Está escrito nos profetas: E serão todos ensinados por Deus. Portanto, todo aquele que do Pai ouviu e aprendeu vem a mim" (Jo 6.37,39,44,45).

Aqui parece que ninguém pode vir a Cristo, exceto se for impulsionado pelo Pai. Todo aquele que é impulsionado pelo Pai com um impulso eficaz, ou todo aquele que ouve ou aprende do Pai vem a Cristo, e ninguém mais. O Pai não leva ninguém a Cristo, além daqueles que Ele deu a Cristo; porque esses, e somente esses, são os filhos de Deus. "E todos os teus filhos serão discípulos do Senhor; e a paz de teus filhos será abundante" (Is 54.13). A partir dessas passagens parece que ninguém vem a Cristo, exceto aqueles que são impulsionados pelo Pai, e que ninguém é impulsionado pelo Pai, exceto aqueles que Ele deu a seu Filho, ou os eleitos; e quanto àqueles que assim são impulsionados a Cristo, a vontade do Pai é que Ele não perca nenhum, mas que ressuscite a todos no último dia. Mas observe que o meu objetivo particular exatamente agora é estabelecer o fato que ninguém vem a Cristo, exceto aqueles que fazem parte do número dos que são dados a Cristo; e também que todos aqueles que a Ele são dados a Ele virão. Esses, e somente esses, são efetivamente chamados ou impulsionados pelo Pai. Todos são chamados, no sentido de serem convidados de modo honesto e com a devida antecedência, sendo que toda a divina persuasão a eles endereçada lhes é sabiamente dirigida. Porém, outros, além daqueles que são dados ao Filho, não são, de fato, persuadidos e efetivamente impulsionados, no sentido de assegurar a "conformidade do livre-arbítrio com a graça gratuitamente concedida".

A mesma verdade é fortemente implícita em muitas outras passagens dos ensinos de Cristo. Ele diz, por exemplo: "Na verdade, na verdade vos digo que aquele que não entra pela porta no curral das ovelhas, mas sobe por outra parte, é ladrão e salteador. Aquele, porém, que entra pela porta é o pastor das ovelhas. A este o porteiro abre, e as ovelhas ouvem a sua voz, e chama pelo nome às suas ovelhas e as traz para fora. E, quando tira para fora as suas ovelhas, vai adiante delas, e as ovelhas o seguem, porque conhecem a sua voz. Mas, de modo nenhum, seguirão o estranho; antes, fugirão dele, porque não conhecem a voz dos estranhos. Jesus disse-lhes esta parábola, mas eles não entenderam o que era que lhes dizia" (Jo 10.1-6).

Cristo então começa a explicar a parábola. Ele mesmo é o bom pastor, que cuida das ovelhas de seu Pai. E afirma: "Em verdade vos digo que eu sou a porta das ovelhas. Todos quantos vieram antes de mim são ladrões e salteadores, mas as ovelhas não os ouviram. Eu sou a porta; se alguém entrar por mim, salvar-se-á, e entrará, e sairá, e achará pastagens. O ladrão não vem senão a roubar, a matar e a destruir; eu vim para que tenham vida e a tenham com abundância. Eu sou o bom Pastor; o bom Pastor dá a sua vida pelas ovelhas. Mas o mercenário, que não é pastor, de quem não são as ovelhas, vê vir o lobo, e deixa as ovelhas, e foge; e o lobo as arrebata e dispersa. Ora, o mercenário foge, porque é mercenário e não tem cuidado das ovelhas. Eu sou o bom Pastor, e conheço as minhas ovelhas, e das minhas sou conhecido. Assim como o Pai me conhece a mim, também eu conheço o Pai e dou a minha vida pelas ovelhas. Ainda tenho outras ovelhas que não são deste aprisco; também me convém agregar estas, e elas ouvirão a minha voz, e haverá um rebanho e um Pastor. Por isso, o Pai me ama, porque dou a minha vida para tornar a tomá-la" (Jo 10.7-17).

Cristo possuía outras ovelhas que ainda não haviam sido chamadas - não faziam parte deste aprisco - isto é, não eram judeus, mas gentios; Ele deveria também agregá-las. Aos judeus incrédulos que o criticavam, disse:

"Mas vós não credes, porque não sois das minhas ovelhas, como já vo-lo tenho dito. As minhas ovelhas ouvem a minha voz, e eu conheço-as, e elas me seguem; e dou-lhes a vida eterna, e nunca hão de perecer, e ninguém as arrebatará das minhas mãos. Meu Pai, que mas deu, é maior do que todos; e ninguém pode arrebatá-las das mãos de meu Pai" (Jo 10.26-29).

Aqui está plenamente implícito que todas aquelas ovelhas foram dadas a Cristo pelo Pai, e que todas elas certamente ouviriam e conheceriam a sua voz e o seguiriam; porém aquelas que não eram suas ovelhas, ou que não lhe tivessem sido dadas pelo Pai, não creriam. Jesus diz no verso 26: "Mas vós não credes, porque não sois das minhas ovelhas, como já vo-lo tenho dito". Aquilo que diz soma-se à seguinte paráfrase: "todas aquelas são ovelhas que me foram dadas por meu Pai. Todas as minhas ovelhas assim dadas deverão ouvir e ouvirão a minha voz e me seguirão, e nenhuma outra o fará". Não destaco nesta passagem o que Ele diz a respeito da certeza da salvação de suas ovelhas, pois o meu objetivo presente é somente mostrar que aquelas e somente aquelas que são dadas pelo Pai -- ou os eleitos -- vêm a Cristo.

Esta mesma verdade é expressamente ensinada, ou fortemente implícita em muitas outras passagens, e me parece ser na realidade toda a doutrina bíblica. "E sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados por seu decreto" (Romanos 8.28). Neste texto, aqueles que amam a Deus são representados de modo idêntico àqueles "que são chamados de acordo com o seu propósito". Em outras palavras, aqueles que amam a Deus e que são chamados de acordo com, ou como conseqüência de sua eleição. Todos aqueles que amam a Deus o fazem por haver sido efetivamente chamados de acordo com o propósito ou com a eleição de Deus. Esta passagem parece resolver a questão, especialmente quando vista nesta conexão de que todos aqueles que amam a Deus fazem parte do grupo de eleitos e são persuadidos a amar a Deus em conformidade com a sua eleição.

Teremos ocasião, mais tarde, de examinar a conexão na qual esta passagem é encontrada, com o propósito de mostrar que todos aqueles que em qualquer tempo verdadeiramente passam a amar a Deus serão salvos. Apenas citei o verso 28 com o propósito de mostrar, não diretamente, que todos aqueles que amam a Deus em qualquer época serão salvos, mas que estes são parte do conjunto de eleitos, devendo a sua salvação final ser inferida a partir deste fato.

Esta claro que os apóstolos consideravam a regeneração como uma evidência conclusiva da eleição. O modo pelo qual se dirigem aos cristãos me parece colocar este fato acima de qualquer dúvida. Paulo, escrevendo aos Tessalonicenses, diz: "Mas devemos sempre dar graças a Deus, por vós, irmãos amados do Senhor, por vos ter Deus elegido desde o princípio para a salvação, em santificação do Espírito e fé da verdade" (2 Ts 2.13). Nesta passagem o apóstolo se refere a todos os irmãos em Tessalônica, como amados do Senhor, e como sendo escolhidos para a salvação desde a eternidade. Ele se sentia chamado a render graças a Deus por este motivo, por Deus tê-los escolhido para a salvação desde a eternidade. Ele representa este fato como verdadeiro a respeito de toda a igreja: isto é, sem dúvida, a respeito de todos os verdadeiros cristãos na Igreja.

Na verdade, os apóstolos falaram em todas as passagens, como se considerassem a todos os verdadeiros santos como eleitos, sendo a santidade a evidência de sua eleição. Pedro, escrevendo aos cristãos em sua primeira epístola, diz:

"Pedro, apóstolo de Jesus Cristo, aos estrangeiros dispersos no Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia, eleitos segundo a presciência de Deus Pai, em santificação do Espírito, para a obediência e aspersão do sangue de Jesus Cristo: graça e paz vos sejam multiplicadas. Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, segundo a sua grande misericórdia, nos gerou de novo para uma viva esperança, pela ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos, para uma herança incorruptível, incontaminável e que se não pode murchar, guardada nos céus para vós que, mediante a fé, estais guardados na virtude de Deus, para a salvação já prestes para se revelar no último tempo, em que vós grandemente vos alegrais, ainda que agora importa, sendo necessário, que estejais por um pouco contristados com várias tentações, para que a prova da vossa fé, muito mais preciosa do que o ouro que perece e é provado pelo fogo, se ache em louvor, e honra, e glória na revelação de Jesus Cristo; ao qual, não o havendo visto, amais; no qual, não o vendo agora, mas crendo, vos alegrais com gozo inefável e glorioso, alcançando o fim da vossa fé, a salvação da alma" (1 Pe 1.1-9).

Nesta passagem está claro que Pedro considerava a todos aqueles nascidos de novo como possuindo uma viva esperança, ou como sendo regenerados, como eleitos, ou como escolhidos para a salvação. Eu poderia procurar este argumento como algo de extensão indefinida, porém devo cuidar de outras considerações em suporte à doutrina em questão.

Para a presente conclusão, quero dizer aquilo que tenho a dizer sobre este ramo de argumento, em particular, lembrando-lhes que Cristo foi expressamente declarado de modo que nenhuma pessoa é capaz de vir a Ele, ou vem a Ele, a não ser que o Pai a traga. E ainda, que o Pai traz a Cristo aqueles - e por justa inferência somente aqueles - que Ele tem dado a Cristo; além do mais, é da vontade do Pai que daqueles a quem o Pai tem dado a Cristo e a Ele levado, Cristo não perca nenhum, mas que a todos ressuscite no último dia. Penso estar evidente que quando Cristo afirma ser a vontade do Pai que não perca nenhum daqueles que o Pai lhe deu, mas que ressuscite a todos no último dia, Ele pretendia dizer que o seu Pai não o desejava meramente, mas que este era o seu plano. Que o Pai planejava assegurar a salvação deles. Isto veremos de modo mais completo em sua própria ocasião.

2. Observo que Deus é capaz de preservar e guardar da apostasia os verdadeiros santos de modo consistente com a sua liberdade: "por cuja causa padeço também isto, mas não me envergonho, porque eu sei em quem tenho crido e estou certo de que é poderoso para guardar o meu depósito até àquele Dia" (2 Tm 1.12).1 Nesta passagem, o apóstolo expressa a sua completa confiança na capacidade que Cristo tem de guardá-lo; e, na realidade, conforme já dito, é sobretudo manifesto que os apóstolos esperavam perseverar e serem salvos somente por crer na habilidade e disposição de Deus de guardá-los de qualquer queda. Novamente: "Quem és tu que julgas o servo alheio? Para seu próprio senhor ele está em pé ou cai; mas estará firme, porque poderoso é Deus para o firmar" (Rm 14.4). E, uma vez mais, "que transformará o nosso corpo abatido, para ser conforme o seu corpo glorioso, segundo o seu eficaz poder de sujeitar também a si todas as coisas" (Fp 3.21). Novamente: "Ora, àquele que é poderoso para fazer tudo muito mais abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o poder que em nós opera" (Ef 3.20). E, uma vez mais, "Ora, àquele que é poderoso para vos guardar de tropeçar e apresentar-vos irrepreensíveis, com alegria, perante a sua glória" (Jd 24). Novamente: "E Deus é poderoso para tornar abundante em vós toda graça, a fim de que, tendo sempre, em tudo, toda suficiência, superabundeis em toda boa obra" (2 Co 9.8). "...tendo iluminados os olhos do vosso entendimento, para que saibais qual seja a esperança da sua vocação e quais as riquezas da glória da sua herança nos santos e qual a sobreexcelente grandeza do seu poder sobre nós, os que cremos, segundo a operação da força do seu poder, que manifestou em Cristo, ressuscitando-o dos mortos e pondo-o à sua direita nos céus" (Ef 1.18-20). E, uma vez mais, "Portanto, pode também salvar perfeitamente os que por ele se chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles" (Hb 7.25). Estas e muitas outras passagens provam, acima de qualquer dúvida, que Deus é capaz de preservar os seus santos.

3. Deus não é somente capaz de guardar a todos aqueles que vêm a Cristo, ou a todos os verdadeiros cristãos; mas este é também o seu desejo. Porém Cristo resolveu esta questão, como já vimos. "Tudo o que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora. Porque eu desci do céu não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou. E a vontade do Pai, que me enviou, é esta: que nenhum de todos aqueles que me deu se perca, mas que o ressuscite no último Dia. Porquanto a vontade daquele que me enviou é esta: que todo aquele que vê o Filho e crê nele tenha a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último Dia" (Jo 6.37-40).

Aqui, então, vimos estes dois pontos resolvidos, isto é, que Deus é capaz de salvar a todos os santos, ou todos aqueles que em qualquer época verdadeiramente crêem em Cristo e a Ele vêm; e que está disposto, ou que deseja fazê-lo. Agora, se Deus é tanto capaz quanto disposto a guardar e a salvar todos os santos, Ele certamente o fará.

Porém, sei que neste ponto haverá objeções de que por esta lógica de argumentação a doutrina da salvação universal poderia ser estabelecida. A Bíblia, dizem, representa Deus como capaz e disposto a salvar a todos os homens, e se Ele é capaz e disposto a salvar a todos os santos, fica provado que todos serão salvos; segue-se que sendo Deus capaz e disposto a salvar todos os homens, todos os homens serão salvos. Mas estes dois casos não são paralelos; pois Deus não professa em nenhuma passagem a habilidade de salvar todos os homens, mas, pelo contrário, repudia tal habilidade e professa não ser capaz de salvar todos os homens; isto é, Ele não pode, sob determinadas circunstâncias, salvá-los de modo sábio e nem pode fazer mais, de modo sábio, seja por santos ou pecadores, além daquilo que já faz. Nenhuma passagem pode ser encontrada na Bíblia, na qual Deus afirme a sua habilidade de salvar todos os homens. As passagens que afirmam que "Deus é capaz de fazer todas as coisas" (Dt 3.24), e que "Acaso, seria qualquer coisa maravilhosa demais para mim?" (Jr 32.17) e outras semelhantes não podem ser entendidas como afirmando a habilidade de Deus de salvar todos os homens. Aqueles que assim afirmam implicam que Ele tem o poder de fazer tudo o que for objeto de onipotência física; porém o ato de salvar pecadores não é um objeto de poder no campo físico. A salvação deles, se completamente consumada, deve ser provocada por uma influência moral e persuasiva, e não pelo exercício da onipotência física. No sentido em que podemos de modo justo aplicar os termos habilidade e inabilidade ao assunto, Deus é realmente incapaz de fazer aquilo que para Ele não seja sábio fazer. Ele tem um fim em vista. Este fim é o mais alto bem e as bênçãos para os seres, em termos universais. Este fim somente pode ser realizado através da utilização dos meios apropriados, ou sob certas condições. Essas condições incluem a perfeita santificação dos agentes morais. Se Deus não puder sabiamente utilizar esses meios que garantirão a conversão e a santificação de pecadores, Ele não os poderá salvar. Isto é, não será capaz de salvá-los. Deus repetidamente professa que não é capaz de fazê-lo.

"Desejaria eu, de qualquer maneira, a morte do ímpio? Diz o Senhor Jeová; não desejo, antes, que se converta dos seus caminhos e viva? Porque não tomo prazer na morte do que morre, diz o Senhor Jeová; convertei-vos, pois, e vivei" (Ez 18.23,32).

"Dize-lhes: Vivo eu, diz o Senhor Jeová, que não tenho prazer na morte do ímpio, mas em que o ímpio se converta do seu caminho e viva; convertei-vos, convertei-vos dos vossos maus caminhos; pois por que razão morrereis, ó casa de Israel?" (Ez 33.11).

"Que mais se podia fazer à minha vinha, que eu lhe não tenha feito? E como, esperando eu que desse uvas boas, veio a produzir uvas bravas?" (Is 5.4). "Como te deixaria, ó Efraim? Como te entregaria, ó Israel? Como te faria como Admá? Por-te-ia como Zeboim? Está mudado em mim o meu coração, todos os meus pesares juntamente estão acesos" (Os 11.8).

Estes são apenas exemplos do modo como Deus fala de sua habilidade para salvar os pecadores e para fazer mais pela igreja ou pelo mundo do que já faz. A partir de tais profissões por parte de Deus, devemos compreendê-lo como se estivesse negando que tenha a habilidade para fazer mais do que já faz, ou para fazê-lo de modo diferente, e que seja consistente com o mais alto bem-estar dos seres em geral. Uma vez que o mais alto bem dos seres, em geral, é o fim que está procurando assegurar, Ele "deve justamente ser compreendido como incapaz de fazer, seja o que for, que não possa fazer de modo consistente com a utilização desses meios que assegurarão esse final". Deus, portanto, não afirma a sua habilidade de salvar todos os homens, mas ao invés disto rejeita de todo modo esta habilidade, professando fazer, e estar fazendo, tudo o que pode fazer para salvá-los. Ele professa ser perfeitamente benevolente e infinitamente sábio e estar fazendo tudo o que a sua infinita sabedoria e benevolência são capazes de fazer pelos pecadores e por todos os seres humanos, lamentando que tudo aquilo que pode fazer não salva e não salvará muitos deles.

Porém, a respeito dos santos, Deus expressamente afirma a sua habilidade de mantê-los, no sentido de assegurar-lhes a salvação. Isto temos visto. Ele faz a favor dos santos tudo aquilo que lhe é possível fazer com sabedoria, e faz o suficiente, como Ele mesmo afirma de forma expressa, para lhes assegurar a salvação. Ninguém é capaz de atentamente ler e considerar as passagens relativas à habilidade de Deus quanto a salvar todos os homens, e a sua habilidade de salvar o seu povo, sem que perceba que os dois casos não são paralelos, mas que de fato se contrastam. Deus expressamente afirma a sua habilidade de guardar, santificar e salvar os seus filhos eleitos, enquanto repetidas vezes, e também de forma expressa, ou por implicação, nega a habilidade de salvar todos os homens.

Uma vez mais, a Bíblia não descreve Deus em nenhuma passagem como desejoso da salvação de todos os homens de qualquer modo, no mesmo sentido em que o representa como desejoso da salvação daqueles que são santos, ou eleitos. As passagens que se seguem são amostras de trechos em que Deus professa a sua vontade de salvar todos os seres humanos:

"Porque isto é bom e agradável diante de Deus, nosso Salvador, que quer que todos os homens se salvem e venham ao conhecimento da verdade" (1 Tm 2.3,4).

"Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna. Porque Deus enviou o seu Filho ao mundo não para que condenasse o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por ele" (Jo 3.16-17).

"O Senhor não retarda a sua promessa, ainda que alguns a têm por tardia; mas é longânimo para convosco, não querendo que alguns se percam, senão que todos venham a arrepender-se" (2 Pe 3.9).

Estas passagens, bem como passagens semelhantes, ensinam que Deus deseja a salvação de todos os homens apenas no sentido de sua vontade. Isto sabemos pelo fato de que Ele em nenhuma passagem demonstra disposição, no sentido de desígnio ou intenção, de salvar todos os seres humanos; mas, pelo contrário, é revelado um propósito ou desígnio oposto; isto é, Deus revela como fato que Ele não pode, nem realizará futuramente, e -- é claro -- não espera e nem planeja salvar todos os homens. Através de sua profissão de disposição de salvar todos os homens, podemos apenas compreender que Ele quer dizer que deseja a salvação de todos, e que asseguraria a salvação de todos se houvesse um meio de fazê-lo sabiamente. Isto é tudo o que podemos entender que está afirmando, a menos que fosse possível acusá-lo de contradição.

Mas Deus professa a disposição de salvar os seus eleitos, em outras palavras, todas as pessoas que foram regeneradas, ou todos os crentes em Cristo, e todos aqueles que futuramente crerão nEle em verdade, no sentido de ter o propósito ou o plano de salvá-los. Este fato é manifesto a partir das escrituras que já examinamos e ainda aparecerá nas passagens que examinaremos.

Já vimos que o Pai deu a Cristo um certo número de pessoas com o expresso desejo de assegurar a salvação delas; que Ele se comprometeu a fornecer todo o poder e influências necessários para salvá-las, e elas de fato serão salvas. Nada semelhante pode ser encontrado na Bíblia no que diz respeito a qualquer outra classe de pessoas. Então esta objeção não possui qualquer fundamento, permanecendo o argumento da habilidade e disposição de Deus em salvar os seus santos em completa força e conclusão.

4. Novamente: Cristo expressamente orou a favor de todos aqueles que nEle crêem e de um modo que assegura que serão guardados e salvos:

"Assim como lhe deste poder sobre toda carne, para que dê a vida eterna a todos quantos lhe deste. Manifestei o teu nome aos homens que do mundo me deste; eram teus, e tu mos deste, e guardaram a tua palavra. Agora, já têm conhecido que tudo quanto me deste provém de ti, porque lhes dei as palavras que me deste; e eles as receberam, e têm verdadeiramente conhecido que saí de ti, e creram que me enviaste. Eu rogo por eles; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus. E todas as minhas coisas são tuas, e as tuas coisas são minhas; e nisso sou glorificado. E eu já não estou mais no mundo; mas eles estão no mundo, e eu vou para ti. Pai santo, guarda em teu nome aqueles que me deste, para que sejam um, assim como nós. Estando eu com eles no mundo, guardava-os em teu nome. Tenho guardado aqueles que tu me deste, e nenhum deles se perdeu, senão o filho da perdição, para que a Escritura se cumprisse. Mas, agora, vou para ti e digo isto no mundo, para que tenham a minha alegria completa em si mesmos. Dei-lhes a tua palavra, e o mundo os odiou, porque não são do mundo, assim como eu não sou do mundo. Eu não rogo somente por estes, mas também por aqueles que, pela sua palavra, hão de crer em mim; para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu, em ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste. E eu dei-lhes a glória que a mim me deste, para que sejam um, como nós somos um. Eu neles, e tu em mim, para que eles sejam perfeitos em unidade, e para que o mundo conheça que tu me enviaste a mim e que tens amado a eles como me tens amado a mim. Pai, aqueles que me deste quero que, onde eu estiver, também eles estejam comigo, para que vejam a minha glória que me deste; porque tu me hás amado antes da criação do mundo" (Jo 17.2, 6-14, 20-24).

Agora observe que nesta oração mais contundente Cristo diz:

(1) No verso 2: "Assim como lhe deste poder sobre toda carne, para que dê a vida eterna a todos quantos lhe deste". Vimos que no sexto capítulo deste livro Cristo ensina expressamente que todos aqueles que lhe são dados pelo Pai vêm a Ele.

(2) Na seqüência afirma que, no exercício deste poder, guardou, em nome de seu Pai, todos aqueles que lhe foram dados e a Ele vieram, e não perdeu nenhum.

(3) Jesus pede ao Pai que daí por diante os guarde em seu próprio nome, pois Ele já estava prestes a deixá-los quanto à sua presença física. Jesus diz no verso 15: "Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal". Novamente diz nos versos 20 a 24: "Eu não rogo somente por estes, mas também por aqueles que, pela sua palavra, hão de crer em mim; para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu, em ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste. E eu dei-lhes a glória que a mim me deste, para que sejam um, como nós somos um. Eu neles, e tu em mim, para que eles sejam perfeitos em unidade, e para que o mundo conheça que tu me enviaste a mim e que tens amado a eles como me tens amado a mim. Pai, aqueles que me deste quero que, onde eu estiver, também eles estejam comigo, para que vejam a minha glória que me deste; porque tu me hás amado antes da criação do mundo".

Agora, tão certamente quanto a oração de Cristo é respondida, todos os crentes serão salvos; isto é, ao menos todos quantos creram, ou ainda virão a crer, em seqüência à esta oração. Mas as orações de Cristo são sempre respondidas.

A isto alguns levantam objeções, alegando que parte desta oração não é respondida, e certamente jamais o será. Diz-se, por exemplo, que no verso 21, Jesus ora a favor da união de todos os crentes, o que, segundo alguns, está muito longe de ser alcançado. Lê-se no verso: "para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu, em ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste". Aqui Jesus explica o sentido no qual Ele ora para que os crentes sejam um; não que devessem todos fazer parte de uma única denominação ou credo, mas que todos tivessem um único e o mesmo Espírito; que o mesmo Espírito que unia o Pai ao Filho, isto é, o Espírito Santo, que está no Pai e no Filho, estivesse também em todos os cristãos. Este é exatamente o sentido daquilo que disse; e disto nenhum daqueles que compreendem ou crêem na Bíblia pode duvidar, que este fato é verdadeiro quanto a todos os verdadeiros cristãos, ou seja, que estes possuem o Espírito Santo, ou o Espírito que habita no Pai e no Filho.

Porém, alguns ainda fazem objeções, dizendo que Cristo orou para que não fosse crucificado e sua oração não foi atendida.

A esses respondo que Cristo não orou com este propósito. E tanto que fez uma ressalva: "se é possível... todavia, não seja como eu quero, mas como tu queres" (Mt 26.39). Se Ele se referia às dores da crucificação pelas quais a sua alma se contraía no jardim, desejando, se possível, que fossem evitadas, fica claro que não orou para que não as sofresse, pelo contrário, submeteu a questão à vontade do Pai. Porém, na oração, em João capítulo 17, Ele não esboçou nenhuma condição, pois sabia que, neste caso, a vontade do Pai era conceder aquilo que estava pedindo. Sobre isto, expressamente informou aos seus discípulos, como já vimos; isto é, que a vontade do Pai era guardar e salvar a todos aqueles que lhe foram dados, e que pelo Pai lhe foram levados. O espírito desta petição está precisamente de acordo com o seu ensino a respeito do tema. Cristo ensinara anteriormente que todos os crentes deveriam ser guardados e salvos, e que esta era a vontade do Pai; agora, poderia Ele, de modo expresso ou implícito, nesta oração, inserir a condição que fazia parte da oração anteriormente mencionada, isto é, "Se esta for a tua vontade?" Embora o que já foi dito seja uma resposta completa à assertiva de que as orações de Cristo nem sempre foram respondidas, deve ser importante dizer, para alguns pensadores, que está longe de ser certo que Cristo tenha orado para que ficasse livre da crucificação.

A despeito de tudo, devemos sempre nos lembrar que Cristo afirma de forma expressa que seu Pai sempre lhe ouve, isto é, sempre responde às suas orações.

"Eu bem sei que sempre me ouves, mas eu disse isso por causa da multidão que está ao redor, para que creiam que tu me enviaste" (Jo 11.42). Novamente, Paulo diz a respeito de Cristo: "Portanto, pode também salvar perfeitamente os que por ele se chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles" (Hb 7.25).

Aqui o apóstolo assevera que Cristo é capaz de salvar perfeitamente todos aqueles que vêm a Deus por seu intermédio, tendo em vista que Ele vive sempre para fazer intercessão a favor deles. Este fato implica, do modo mais direto possível, que as intercessões de Cristo sempre prevalecem. Na verdade, sendo Cristo o mediador, elas devem sempre prevalecer.

Vamos agora considerar o quão longe avançamos no estabelecimento da perseverança e da salvação final de todos os crentes.

(1) Vimos que todos os eleitos para a salvação serão salvos.

(2) Vimos que todos os verdadeiros crentes fazem parte deste número.

(3) Vimos que Deus e Cristo são capazes de guardá-los da apostasia e salvá-los.

(4) Vimos que Ele deseja e o faz de boa vontade.

(5) Que Cristo expressamente orou a favor da perseverança e da salvação final de todos os crentes.

(6) Que Ele orou em expressa concordância com a vontade revelada do Pai, e

(7) Que suas orações sempre prevalecem e são positivamente respondidas.

Na oração de Cristo registrada em João capítulo 17, Ele expressamente afirma que não estava orando a favor do mundo, isto é, por todos os homens. Ele estava orando apenas a favor daqueles que o Pai lhe havia dado. A favor desses orou, não simplesmente para que Deus os salvasse mediante a condição de sua perseverança, mas que Deus os guardasse do mal que está no mundo, e os salvasse, e fizesse com que fossem um, no sentido de que um só Espírito estivesse em todos. As mesmas petições que Jesus fez a favor daqueles que já haviam crido, fez igualmente para aqueles que no futuro viessem a crer.

Se eu encerrasse agora este comentário, o argumento já poderia ser considerado completo e a prova conclusiva. Porém, tendo em vista que esta doutrina é tão abundantemente ensinada na Bíblia, tanto de modo expresso, como de modo implícito, passo à consideração de várias outras passagens que esclarecerão ainda mais o tema.

5. Cristo ensina esta doutrina de modo expresso e planejado:

"E a vontade do Pai, que me enviou, é esta: que nenhum de todos aqueles que me deu se perca, mas que o ressuscite no último Dia. Porquanto a vontade daquele que me enviou é esta: que todo aquele que vê o Filho e crê nele tenha a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último Dia. Na verdade, na verdade vos digo que aquele que crê em mim tem a vida eterna. Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém comer desse pão, viverá para sempre; e o pão que eu der é a minha carne, que eu darei pela vida do mundo" (Jo 6.39,40,47,51).

Nestas passagens Cristo expressamente ensina, conforme já vimos anteriormente, que a vontade de seu Pai é que todos os crentes, ou que todos aqueles que em qualquer época venham a crer (pois este é plenamente o significado), sejam salvos; que Ele não perca nenhum desses, mas que, como vimos em João 17.2, lhes dê a vida eterna. Então Jesus reivindica a habilidade para guardá-los e salvá-los em concordância com a vontade do Pai. Devemos lembrar-nos que isto diz respeito a todos os crentes, ou a todos aqueles que são dados a Cristo, que, como temos aprendido, são as mesmas pessoas.

"As minhas ovelhas ouvem a minha voz, e eu conheço-as, e elas me seguem; e dou-lhes a vida eterna, e nunca hão de perecer, e ninguém as arrebatará das minhas mãos. Meu Pai, que mas deu, é maior do que todos; e ninguém pode arrebatá-las das mãos de meu Pai" (Jo 10.27-29).

A conexão completa mostra que Cristo pretendeu ensinar a certeza da salvação de todas as suas ovelhas, ou de todos os eleitos, ou -- o que é o mesmo -- de todos os verdadeiros crentes. Mas a este fato alguns levantam objeções, dizendo que ninguém permanece na condição de ovelha, exceto se mantiver-se em obediência, e, portanto, a afirmação de que Ele salvará as ovelhas não assegura a salvação daqueles que pecarem em qualquer ocasião. Porém, respondo que Cristo reconhece a todos os eleitos como sendo suas ovelhas, sejam estas já convertidas ou estejam em um estado temporário de desvio. Ele representa suas ovelhas como ouvindo a sua voz e seguindo-o; e representa aquelas que não são as suas ovelhas, como não ouvindo a sua voz e não o seguindo: "Ainda tenho outras ovelhas que não são deste aprisco; também me convém agregar estas, e elas ouvirão a minha voz, e haverá um rebanho e um Pastor. Mas vós não credes, porque não sois das minhas ovelhas, como já vo-lo tenho dito" (Jo 10.16,26).

E novamente disse: "Que vos parece? Se algum homem tiver cem ovelhas, e uma delas se desgarrar, não irá pelos montes, deixando as noventa e nove, em busca da que se desgarrou? E, se, porventura, a acha, em verdade vos digo que maior prazer tem por aquela do que pelas noventa e nove que se não desgarraram. Assim também não é vontade de vosso Pai, que está nos céus, que um destes pequeninos se perca" (Mt 18.12-14).

A intenção desta parábola é ensinar a doutrina que estou defendendo. Se não o fosse, qual seria a intenção? Esta é uma resposta completa à objeção que afirma não serem mais reconhecidos como ovelhas os que se desviam.

Porém, novamente, se diz que, embora ninguém seja capaz de arrebatar as ovelhas da mão do Pai, contudo as próprias pessoas são capazes de fazê-lo, em relação a si mesmas. Reconheço que podemos fazê-lo por uma possibilidade natural; contudo, esta objeção não tem valor algum, pois Cristo diz expressamente: "As minhas ovelhas ouvem a minha voz, e eu conheço-as, e elas me seguem; e dou-lhes a vida eterna, e nunca hão de perecer, e ninguém as arrebatará das minhas mãos. Meu Pai, que mas deu, é maior do que todos; e ninguém pode arrebatá-las das mãos de meu Pai" (Jo 10.27-29).

Não apenas ninguém é capaz de arrebatar as ovelhas das mãos de seu Pai, como o próprio Cristo lhes dá a vida eterna, e nunca hão de perecer. Este fato implica que, enquanto as ovelhas podem, ou têm a capacidade de apostatarem e se perderem, contudo, de fato, jamais o farão. O que se pode concluir, então, a partir de tudo aquilo que Cristo diz a respeito de si mesmo como Pastor, nesta passagem, se vier a perder algumas de suas ovelhas? Que cada um pondere todo o capítulo e tire as suas conclusões.

6. Outro argumento em apoio à doutrina que estamos considerando, e que posso deduzir a partir dos fatos, é que Paulo, um apóstolo inspirado, creu nela.

"Paulo e Timóteo, servos de Jesus Cristo, a todos os santos em Cristo Jesus que estão em Filipos, com os bispos e diáconos: graça a vós e paz, da parte de Deus, nosso Pai, e da do Senhor Jesus Cristo. Dou graças ao meu Deus todas as vezes que me lembro de vós, fazendo, sempre com alegria, oração por vós em todas as minhas súplicas, pela vossa cooperação no evangelho desde o primeiro dia até agora. Tendo por certo isto mesmo: que aquele que em vós começou a boa obra a aperfeiçoará até ao Dia de Jesus Cristo" (Fp 1.1-6).

Nesta passagem o apóstolo representa a si mesmo como dando graças por todos os santos em Filipos, alicerçado em sua confiança de que aquele que neles começou a boa obra a aperfeiçoará, ou a realizará até o Dia de Jesus Cristo. A confiança de Paulo não repousava nos filipenses, mas na fidelidade de Cristo. Ele não expressou a confiança de que os filipenses seriam por si mesmos perseverantes, mas confiava que aquele que neles começou a boa obra daria a devida continuidade: isto é, que Cristo trabalharia neles para guardá-los e para assegurar a perseverança de cada um até o final. Esta era a expectativa de Paulo em relação a todos os santos que estavam em Filipos.

Mas se Paulo cria desta forma quanto a todos os santos naquele lugar, pode-se inferir de forma plena que assim cria simplesmente porque o esperava quanto a todos os verdadeiros santos. Paulo não expressou que possuía esta esperança devido à existência de alguma particularidade no caso dos filipenses, isto é, não porque fossem melhores do que outros santos, ou porque Deus fosse fazer algo mais por eles do que por outros. O apóstolo parece ter expressado a sua confiança de modo pleno, sobre o fundamento de suas expectativas, de que Aquele que começa a boa obra na vida de qualquer santo dará a ela o devido prosseguimento e a aperfeiçoará até o dia de Cristo. Alguns poderiam ainda dizer que Paulo pretendia meramente expressar a convicção ou a opinião de um homem bom de que os filipenses santificados seriam salvos, mas que não pretendeu proclamar isto como sendo a voz da inspiração; a esta objeção respondo que Paulo expressa plenamente a confiança de que todos seriam salvos e que o próprio Deus aperfeiçoaria a obra que Ele mesmo começou. Agora, como é que Paulo alcançou tamanha confiança? Paulo era um homem inspirado. Se a inspiração lhe ensinou que os verdadeiros santificados caem e se perdem, como é que poderia expressar de modo tão consistente uma persuasão tão minuciosa que todos os santos em Filipos seriam salvos? Se Paulo cria na doutrina da perseverança dos santos, isto deve ser verdadeiro, ou ele foi enganado a respeito desta importante doutrina. Mas não é seguro confiar na opinião de Paulo quanto a esta doutrina? Se alguém estiver disposto a contender que não podemos com estrita justiça inferir que Paulo cria do mesmo modo, com respeito a Deus aperfeiçoar a obra em todos aqueles que são santificados, assim como acreditava que se faria aos filipenses, eu não contenderia a este respeito. É, contudo, claro que Paulo em nenhuma parte desta epístola, e nem em qualquer outra passagem, declara que tenha maiores expectativas quanto à salvação dos filipenses do que tinha a respeito da salvação de todos os verdadeiros santos. Ao escrever às igrejas, os apóstolos parecem ter considerado e falado sobre todos os verdadeiros santos como os filhos eleitos de Deus. Eles parecem representar a salvação de todas essas pessoas como certa, porém sempre mantendo em mente e assegurando, tanto de modo expresso como por meio da implicação, a natureza desta certeza, que foi condicionada sobre o direito e a utilização perseverante da própria vontade dessas pessoas. Os apóstolos conseqüentemente e de modo constante se empenham por guardar os membros das igrejas do engano, com respeito a serem verdadeiramente santos, admoestando-os a provarem-se a si mesmos a esse respeito, prevenindo-os também contra a suposição de que podem ser salvos sem de fato a devida perseverança na fé e na obediência até o final de sua vida.

7. Os apóstolos pareciam considerar a conversão de pecadores como uma evidência de que Deus planejou salvá-los, ou que faziam parte dos eleitos:

"Louvando a Deus e caindo na graça de todo o povo. E todos os dias acrescentava o Senhor à igreja aqueles que se haviam de salvar" (At 2.47).

"E os gentios, ouvindo isto, alegraram-se e glorificavam a palavra do Senhor, e creram todos quantos estavam ordenados para a vida eterna" (At 13.48).

Nestas e nas demais passagens, a Bíblia refere-se à conversão dos pecadores como a resposta para a questão de sua salvação. Mas se os verdadeiros santos caem da graça e perecem, por que deveriam os escritores inspirados expressar-se tão freqüentemente como se considerassem a regeneração de uma pessoa uma indicação de que seja um dos eleitos e assegurando a sua salvação?

São comuns as passagens bíblicas em que Cristo e os apóstolos falam da regeneração, como sendo a resposta para a questão da salvação daqueles que são regenerados a ponto de grandes multidões terem deixado de tomar conhecimento do fato de haver qualquer outra condição para a salvação sustentada pela Bíblia. Quando o carcereiro perguntou a Paulo e Silas o que deveria fazer para ser salvo, Paulo lhe respondeu: "Crê no Senhor Jesus Cristo e serás salvo, tu e a tua casa" (At 16.31).

Aqui, como é comum na Bíblia, fala-se da fé como sendo a condição única para a salvação. Freqüentemente faz-se referência ao arrependimento, à fé, à regeneração, como é do conhecimento de todos os estudantes da Bíblia, como sendo as únicas condições para a salvação. Agora, a mim me parece que poderia não ser assim, e não teria razão de ser, caso não houvesse certa conexão, de algum modo, entre a real conversão e a eterna salvação. E certo que a necessidade de perseverarmos até o fim é freqüentemente mencionada, com insistência na Bíblia, como uma condição de salvação, assim como deveria ser esperado quando consideramos a natureza da certeza em questão. Se não existir, contudo, certa conexão entre a regeneração ou a fé, ou o arrependimento e a salvação, parece-me inacreditável que devêssemos tão freqüentemente encontrar a fé, o arrependimento e a conversão de que se fala como se assegurassem a salvação.

Aqueles que crêem são representados como já possuidores da vida eterna, não entrando em condenação, mas como tendo passado da morte para a vida. As passagens a seguir são exemplos da maneira pela qual as Escrituras falam do assunto.

"Mas a todos quantos o receberam deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus: aos que crêem no seu nome, os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do varão, mas de Deus" (Jo 1.12-13).

"Aquele que crê no Filho tem a vida eterna, mas aquele que não crê no Filho não verá a vida, mas a ira de Deus sobre ele permanece. Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna. Quem crê nele não é condenado; mas quem não crê já está condenado, porquanto não crê no nome do unigênito Filho de Deus" (Jo 3.36,16,18).

"Mas aquele que beber da água que eu lhe der nunca terá sede, porque a água que eu lhe der se fará nele uma fonte de água a jorrar para a vida eterna" (Jo 4.14).

"Na verdade, na verdade vos digo que quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou tem a vida eterna e não entrará em condenação, mas passou da morte para a vida" (Jo 5.24).

"Tudo o que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora. Porquanto a vontade daquele que me enviou é esta: que todo aquele que vê o Filho e crê nele tenha a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último Dia. Está escrito nos profetas: E serão todos ensinados por Deus. Portanto, todo aquele que do Pai ouviu e aprendeu vem a mim. Na verdade, na verdade vos digo que aquele que crê em mim tem a vida eterna" (Jo 6.37,40,45,47).

"E disse-lhes Pedro: Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo para perdão dos pecados, e recebereis o dom do Espírito Santo" (At 2.38).

"E disse-lhes: Ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura. Quem crer e for batizado será salvo; mas quem não crer será condenado" (Mc 16.15-16).

Agora, parece-me que esta numerosa classe de passagens fortemente implica em que exista uma certa conexão, de algum tipo, entre a vinda de Cristo, o ato de receber a Cristo e a vida eterna. Observe, não estou argumentando que a perseverança na fé e a obediência também não sejam uma condição de salvação, mas, pelo contrário, que realmente o são. Também não discuto que as representações tais como as que se encontram acima resolvam a questão de que todos aqueles que em qualquer época se arrependam, creiam, ou venham a Cristo serão salvos. O meu objetivo aqui é mostrar que esta classe de textos é exatamente o que deveríamos esperar, se o fato da regeneração estivesse certamente ligado à salvação, e exatamente aquilo que não deveria ser, caso esta conexão não fosse verdadeira.

A este fato alguns fazem objeções, dizendo que muitos que trabalharam no ministério de Cristo são representados de tempos em tempos como crendo e dos quais é quase imediatamente afirmado que voltaram as costas e não mais andaram com o Senhor.

Respondo que a Bíblia, com clareza, reconhece diferentes tipos de fé, tais como a fé intelectual, a fé para a operação de milagres e a fé de coração. As seguintes passagens são exemplos do tratamento bíblico para este assunto:

"E creu até o próprio Simão; e, sendo batizado, ficou, de contínuo, com Filipe e, vendo os sinais e as grandes maravilhas que se faziam, estava atônito. Tu não tens parte nem sorte nesta palavra, porque o teu coração não é reto diante de Deus" (At 8.13,21).

"Tu crês que há um só Deus? Fazes bem; também os demônios o crêem e estremecem" (Tg 2.19).

Estas e muitas outras passagens falam com clareza de uma fé intelectual, ou de uma simples convicção da verdade.

E exemplos do modo como a fé para operação de milagres é representada encontram-se em Mateus 7.22,23 e 1 Coríntios 13.1,2.

Veja Romanos 10.9-11; Atos 8.37 e Gaiatas 5.6. Estas e outras passagens falam da fé no Evangelho, ou da fé de coração. Quando se fala da multidão como crentes sob as instruções de Cristo, ou vendo os seus milagres, e então retirando-se e não mais andando com Ele, compreendemos, sem dúvida, que aquelas passagens estão simplesmente ensinando que estiveram naquela ocasião convencidos de que Cristo é o Messias, e que intelectualmente creram ser Ele exatamente aquilo que professou. Porém, a história dessas pessoas parece proibir a conclusão de que tenham sido verdadeiramente regeneradas, ou que tivessem a verdadeira fé do Evangelho.

Novamente, João fala daqueles que abertamente apostataram, como se jamais tivessem sido verdadeiros cristãos: "Saíram de nós, mas não eram de nós; porque, se fossem de nós, ficariam conosco; mas isto é para que se manifestasse que não são todos de nós" (1 Jo 2.19). Observe a força das expressões: "Saíram de nós... não são todos de nós"; isto significa dizer que não eram verdadeiros cristãos. Por que o apóstolo o diz desse modo? João declara o motivo pelo qual foi feita essa afirmação: "porque, se fossem de nós, ficariam conosco; mas isto é para que se manifestasse que não são todos de nós". Ou seja, uma parte daqueles que professavam ser discípulos deixou o grupo e retornou ao mundo, para que fosse manifesto quais eram e quais não eram cristãos. Não afirmo, contudo, que esta conclusão esteja indubitavelmente ensinada nesta passagem; porém não pode ser negado que esta seja a sua construção mais natural.

8. Os habitantes do céu parecem crer na existência de certa conexão entre o arrependimento e a salvação.

"Digo-vos que assim haverá alegria no céu por um pecador que se arrepende, mais do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento" (Lc 15.7). Agora esta alegria é certamente prematura, a menos que tenham a expectativa de que aquele que se arrependeu será salvo. Se, depois de tudo, existir uma incerteza quanto ao resultado, na estimativa deles, ou se possivelmente existir a possibilidade, ou houver uma probabilidade de que aquele que se arrependeu caia, e sofra uma perdição amplamente mais agravada do que aquela que sofreria se jamais tivesse sido esclarecido, alguém poderia pensar que os seres celestiais ao menos deveriam suspender o seu triunfo até que o resultado final fosse conhecido. Poderíamos estar certos de que eles deveriam regozijar-se, se o pecador rompeu temporariamente com os seus pecados, bem como pelo sua provável salvação; mas pára mim esta passagem deve ser lida exatamente como se deve esperar que seja lida; os seres celestiais consideraram o arrependimento como certamente ligado à salvação final ou definitiva.

Novamente, existem várias parábolas que parecem tomar a perseverança dos santos como garantida, ou ainda parecem assumir essa verdade. O verso imediatamente precedente àquele que citei parece ser um desses trechos.

"E ele lhes propôs esta parábola, dizendo: Que homem dentre vós, tendo cem ovelhas e perdendo uma delas, não deixa no deserto as noventa e nove e não vai após a perdida até que venha a achá-la? E, achando-a, a põe sobre seus ombros, cheio de júbilo; e, chegando à sua casa, convoca os amigos e vizinhos, dizendo-lhes: Alegrai-vos comigo, porque já achei a minha ovelha perdida. Digo-vos que assim haverá alegria no céu por um pecador que se arrepende, mais do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento" (Lc 15.3-7).

Agora, por que há esta alegria pelo retorno de uma ovelha desviada ou perdida, se não existe nenhuma certeza, ou quase nenhuma probabilidade de que essa pessoa não se desviará novamente e seja finalmente perdida, sofrendo uma agravada destruição? Imediatamente após esta parábola, existe uma outra que tem o mesmo conteúdo.

"Ou qual a mulher que, tendo dez dracmas, se perder uma dracma, não acende a candeia, e varre a casa, e busca com diligência até a achar? E, achando-a, convoca as amigas e vizinhas, dizendo: Alegrai-vos comigo, porque já achei a dracma perdida. Assim vos digo que há alegria diante dos anjos de Deus por um pecador que se arrepende" (Lc 15.8-10).

Aqui novamente é preciso perguntar o por que dessa grande alegria pelo encontro do pecador, a menos que a sua conversão deva resultar em sua salvação final.

Não cito estas passagens como prova da doutrina em questão, mas somente como exemplos da classe de passagens que parece assumir a verdade da doutrina, e sendo apenas aquilo que se deveria esperar, se a doutrina for verdadeira; e sendo o que não se deveria esperar se a doutrina não fosse verdadeira.

A isto respondem que existem muitas passagens que não são exatamente aquilo que poderíamos esperar, se a perseverança dos santos fosse verdadeira. Confio que as seguintes passagens podem ser consideradas como exemplos dessa classe:

"Pelo que, deixando os rudimentos da doutrina de Cristo, prossigamos até a perfeição, não lançando de novo o fundamento do arrependimento de obras mortas e de fé em Deus, e da doutrina dos batismos, e da imposição das mãos, e da ressurreição dos mortos, e do juízo eterno. E isso faremos, se Deus o permitir. Porque é impossível que os que já uma vez foram iluminados, e provaram o dom celestial, e se fizeram participantes do Espírito Santo, e provaram a boa palavra de Deus e as virtudes do século futuro, e recaíram sejam outra vez renovados para arrependimento; pois assim, quanto a eles, de novo crucificam o Filho de Deus e o expõem ao vitupério" (Hb 6.1-6).

"Mas, desviando-se o justo da sua justiça, e cometendo a iniqüidade, e fazendo conforme todas as abominações que faz o ímpio, porventura viverá? De todas as suas justiças que tiver feito não se fará memória; na sua transgressão com que transgrediu, e no seu pecado com que pecou, neles morrerá" (Ez 18.24).

"Quando eu disser ao justo que certamente viverá, e ele, confiando na sua justiça, praticar iniqüidade, não virão em memória todas as suas justiças, mas na sua iniqüidade, que pratica, ele morrerá" (Ez 33.13).

"E odiados de todos sereis por causa do meu nome; mas aquele que perseverar até ao fim será salvo" (Mt 10.22).

"Aquele, pois, que cuida estar em pé, olhe que não caia" (1 Co 10.12).

"Mas Cristo, como Filho, sobre a sua própria casa; a qual casa somos nós, se tão-somente conservarmos firme a confiança e a glória da esperança até ao fim. Vede, irmãos, que nunca haja em qualquer de vós um coração mau e infiel, para se apartar do Deus vivo. Antes, exortai-vos uns aos outros todos os dias, durante o tempo que se chama Hoje, para que nenhum de vós se endureça pelo engano do pecado. Porque nos tornamos participantes de Cristo, se retivermos firmemente o princípio da nossa confiança até ao fim" (Hb 3.6,12-14).

"Temamos, pois, que, porventura, deixada a promessa de entrar no seu repouso, pareça que algum de vós fique para trás. Procuremos, pois, entrar naquele repouso, para que ninguém caia no mesmo exemplo de desobediência" (Hb 4.1,11).

"Portanto, irmãos, procurai fazer cada vez mais firme a vossa vocação e eleição; porque, fazendo isto, nunca jamais tropeçareis" (2 Pe 1.10).

Em resposta a esta objeção comento que, ao invés de estas passagens terem um sentido diferente daquele que deveria ser esperado, se a doutrina em questão fosse verdadeira, e portanto implicando que a doutrina não seja verdadeira, elas são precisamente o que delas deve ser esperado, se a doutrina como a tenho declarado for verdadeira. Se esta certeza for apenas uma certeza moral, mesmo quando o fato da conversão está resolvido acima de toda e qualquer dúvida, ou possibilidade de erro - se a salvação final daqueles que são verdadeiramente regenerados for condicionada sobre a perseverança, como se não houvesse certeza sobre ela; e se, além do mais, o fato da conversão for raramente resolvido nesta vida acima de qualquer possibilidade de erro, então estas passagens, ao invés de significarem qualquer incerteza no que diz respeito à salvação final dos santos, são exatamente o que deveria ser esperado que fossem, pois são exatamente o que é necessário, acima da suposição de que a doutrina em questão seja verdadeira. Elas não afirmam que quaisquer verdadeiros santos sejam, ou serão, perdidos. Elas implicam a possibilidade natural e, humanamente falando, o perigo da ocorrência de tal evento. Elas ainda querem dizer que, sem a vigilância e perseverança, a salvação é impossível. Elas também implicam que a prudência, a cautela e a ameaça sejam necessárias. Elas também significam que alguns homens, ao menos alguns, não têm a certeza da própria salvação, e que estes não sabem ao certo que são santos, acima de qualquer possibilidade de erro.

Agora, estas coisas que estão com justiça inferidas nesta classe de passagens são realmente verdadeiras: daí estas passagens vão exatamente ao encontro das necessidades da igreja, sendo, portanto, exatamente aquilo que deveria ser esperado quando todos os fatos no caso são considerados. Não pretendo que esta classe de passagens infira a verdade da doutrina sob consideração, mas que é consistente com ela, como se deveria esperar, sendo a doutrina, como a tenho exposto, verdadeira.

9. A regeneração é representada como garantindo a perseverança em obediência: primeiramente, nas passagens que fazem dela a condição de salvação. Em segundo lugar, nas passagens que expressamente afirmam que aqueles que são verdadeiramente regenerados não vivem e nem podem viver em pecado.

"Qualquer que é nascido de Deus não comete pecado; porque a sua semente permanece nele; e não pode pecar, porque é nascido de Deus" (1 Jo 3.9).

"Amados, amemo-nos uns aos outros, porque a caridade é de Deus; e qualquer que ama é nascido de Deus e conhece a Deus" (1 Jo 4.7).

"Todo aquele que crê que Jesus é o Cristo é nascido de Deus; e todo aquele que ama ao que o gerou também ama ao que dele é nascido. Porque todo o que é nascido de Deus vence o mundo; e esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé. Sabemos que todo aquele que é nascido de Deus não peca; mas o que de Deus é gerado conserva-se a si mesmo, e o maligno não lhe toca" (l Jo 5.1,4,18).

Estas e outras passagens similares ensinam expressamente a natureza perseverante da verdadeira religião pelo Espírito Santo que habita dentro de cada pessoa: em outras palavras, ensinam que aqueles que verdadeiramente são regenerados não podem pecar, no sentido de continuar vivendo em qualquer situação que envolva pecados habituais. Ensinam que, no caso de todas as almas verdadeiramente regeneradas, a santidade é ao menos a regra; o pecado, a exceção; que, ao invés de ser verdadeiro que as almas regeneradas vivem a grande maioria de seus dias subseqüentes à regeneração no pecado, é verdade que elas tão raramente pecam, que, em linguagem forte, deve ser dito em verdade que não pecam. Esta linguagem ensina, de modo tão forte e expressivo, que a perseverança é um atributo infalível do caráter cristão. Ainda que outras passagens nos obriguem a compreender a estas como uma linguagem forte, utilizada em sentido qualificado, deveríamos naturalmente compreendê-las como afirmando que toda alma verdadeiramente regenerada não peca, seja qual for a ocasião. Mas uma vez que esta é uma profunda regra para a interpretação da linguagem de um autor, e que este é, se possível, feito consistente consigo mesmo; uma vez que João, em outras passagens na mesma epístola, e nas demais passagens, representa que os cristãos ou as pessoas verdadeiramente regeneradas algumas vezes pecam; uma vez que este fato é freqüentemente ensinado na Bíblia, devemos compreender estas passagens que acabamos de citar como somente afirmando uma verdade geral, e não universal; isto é, que aqueles que são realmente regenerados habitualmente não pecam, mas que a santidade para essas pessoas é a regra; o pecado, a exceção. Certamente estas passagens não podem ser razoavelmente compreendidas como afirmando e tendo um significado menor do que este. Sei que alguns têm dito que João utilizou a expressão "nascidos de Deus", nestes casos, em sentido mais elevado, e significando mais do que simplesmente a conversão ou regeneração; ele estava como que representando um estado mais elevado do que aquele que poderia ser prognosticado por todos os verdadeiros cristãos. Porém, observe que João especialmente afirma que todos aqueles que realmente crêem são nascidos de Deus.

Uma vez mais, Cristo fala como se Ele mesmo considerasse que somente aqueles que perseverassem em obediência teriam realmente crido. "Jesus dizia, pois, aos judeus que criam nele: Se vós permanecerdes na minha palavra, verdadeiramente, sereis meus discípulos" (Jo 8.31).

A parábola do semeador parece ter sido expressamente planejada para ensinar a natureza da perseverança da verdadeira religião. "Um semeador saiu a semear a sua semente, e, quando semeava, caiu alguma junto do caminho e foi pisada, e as aves do céu a comeram. E outra caiu sobre pedra e, nascida, secou-se, pois que não tinha umidade. E outra caiu entre espinhos, e, crescendo com ela os espinhos, a sufocaram; E outra caiu em boa terra e, nascida, produziu fruto, cento por um. Dizendo ele estas coisas, clamava: Quem tem ouvidos para ouvir, que ouça. Esta é, pois, a parábola: a semente é a palavra de Deus; e os que estão junto do caminho, estes são os que ouvem; depois, vem o diabo e tira-lhes do coração a palavra, para que se não salvem, crendo; e os que estão sobre pedra, estes são os que, ouvindo a palavra, a recebem com alegria, mas, como não têm raiz, apenas crêem por algum tempo e, no tempo da tentação, se desviam; e a que caiu entre espinhos, esses são os que ouviram, e, indo por diante, são sufocados com os cuidados, e riquezas, e deleites da vida, e não dão fruto com perfeição; e a que caiu em boa terra, esses são os que, ouvindo a palavra, a conservam num coração honesto e bom e dão fruto com perseverança" (Lc 8.5-8,11-15).

Se esta parábola não tivesse sido planejada para distinguir a verdadeira religião dentre as falsificadas, e para ilustrar a natureza perseverante da verdadeira religião, então eu não saberia e não poderia imaginar qual seria o seu propósito. Não é necessário que me prolongue mais quanto a este tema. Que cada um leia estes textos e considere a parábola para si.

Novamente, a parábola do fermento parece ter sido também planejada para ensinar a natureza progressiva e perseverante da verdadeira religião.

"Outra parábola lhes disse: O reino dos céus é semelhante ao fermento que uma mulher toma e introduz em três medidas de farinha, até que tudo esteja levedado" (Mt 13.33).

Entendo esta parábola como representando ou ensinando a natureza agressiva da verdadeira fé e piedade, enquanto se mostra tanto nos corações como nas vidas de cristãos, individualmente, e também à medida que progride e estende-se no mundo. Ela é, em sua natureza, perseverante e agressiva, e quando uma vez realmente existe, virá através do triunfo da graça. Quando falo da natureza perseverante da verdadeira religião, não quero dizer que a religião, tal qual existe no coração dos santos nesta vida, prevaleceria e triunfaria sobre os seus inimigos, por si mesma, se não contasse com o apoio da graça e do Espírito de Deus que habita dentro de cada pessoa. Mas o que pretendo mostrar é que, através da fidelidade de Deus, Ele, que começou ou começará a boa obra nos corações, a aperfeiçoará até o dia de Jesus Cristo. O caráter perseverante da verdadeira religião deve-se ao fato de o Espírito Santo habitar dentro de cada pessoa.

Este fato leva-me a observar uma vez mais que o arrependimento é alcançado sob a condição de a pessoa receber o Espírito Santo em sua vida; e quando esse Espírito é recebido, traz a expressa promessa e o compromisso de permanecer nesse coração para sempre.

"E, no último dia, o grande dia da festa, Jesus pôs-se em pé e clamou, dizendo: Se alguém tem sede, que venha a mim e beba. E isso disse ele do Espírito, que haviam de receber os que nele cressem; porque o Espírito Santo ainda não fora dado, por ainda Jesus não ter sido glorificado" (Jo 7.37,39). Aprendemos nesta passagem que a água representa o Espírito Santo. Este fato é abundantemente ensinado na Bíblia. Ouçamos agora o que Cristo disse à mulher de Samaria:

"Jesus respondeu e disse-lhe: Qualquer que beber desta água tornará a ter sede, mas aquele que beber da água que eu lhe der nunca terá sede, porque a água que eu lhe der se fará nele uma fonte de água a jorrar para a vida eterna" (Jo 4.13-14).

A verdade em eminência, ensinada neste texto, é que todo aquele que beber desta água jamais terá sede. Neste ponto, em particular, o Salvador a contrasta com a água da fonte de Jacó, dizendo nos versos 13 e 14: "Jesus respondeu e disse-lhe: Qualquer que beber desta água tornará a ter sede, mas aquele que beber da água que eu lhe der nunca terá sede, porque a água que eu lhe der se fará nele uma fonte de água a jorrar para a vida eterna". Cristo afirma plenamente que este é um fato.

Isto é, o cristão jamais perecerá por falta deste Espírito ou de água, mas este permanecerá no salvo, que saltará para a vida eterna. O Espírito permanecerá nele e o assegurará contra cair e perecer. O fato de que o Espírito habitará com e em todos aqueles que o receberem e triunfará na tarefa de lhes assegurar a salvação, parece ser plenamente ensinado nesta passagem. Novamente: "Vós, porém, não estais na carne, mas no Espírito, se é que o Espírito de Deus habita em vós. Mas, se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é dele. E, se Cristo está em vós, o corpo, na verdade, está morto por causa do pecado, mas o espírito vive por causa da justiça. E, se o Espírito daquele que dos mortos ressuscitou a Jesus habita em vós, aquele que dos mortos ressuscitou a Cristo também vivificará o vosso corpo mortal, pelo seu Espirito que em vós habita" (Rm 8.9-11). Nesta passagem está expressamente declarado que não é cristão aquele que não tem o Espírito Santo, ou o Espírito de Cristo; e que aqueles que são de Cristo não andam segundo a carne, mas após o Espírito; que aqueles que são de Cristo crucificaram, isto é, mortificaram os desejos da carne. Este é o real caráter de todos os verdadeiros santos. Passagens como estas, observe, têm a finalidade de distinguir a verdadeira religião das suas falsificações e ensinar que a perseverança na verdadeira obediência é a característica de todos os verdadeiros santos.

10. Cristo representa o ato de enganar os eleitos como algo impossível (Mt 24.24). Já vimos que os eleitos para a salvação incluem todos os verdadeiros cristãos; isto é, que todos os cristãos são os filhos eleitos de Deus. Eles vieram a Cristo. Observe: o próprio Salvador ensina, como já vimos:

(1) Que ninguém é capaz de vir a Ele, ou crer nEle, a menos que o Pai o traga.

(2) E que o Pai traz a Cristo aqueles, e somente aqueles, que deu a Cristo.

(3) Que todos aqueles que o Pai lhe deu virão a Cristo, e daqueles que vêm a Ele não perderá nenhum, mas ressuscitará a todos no último dia.

"Ninguém pode vir a mim, se o Pai, que me enviou, o não trouxer; e eu o ressuscitarei no último Dia. Está escrito nos profetas: E serão todos ensinados por Deus. Portanto, todo aquele que do Pai ouviu e aprendeu vem a mim. E a vontade do Pai, que me enviou, é esta: que nenhum de todos aqueles que me deu se perca, mas que o ressuscite no último Dia. Porque eu desci do céu não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou. Tudo o que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora. Porquanto a vontade daquele que me enviou é esta: que todo aquele que vê o Filho e crê nele tenha a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último Dia" (Jo 6.44,45,39,38,37,40).

As falsas teorias são representadas como tendo a permissão de testar a compaixão dos verdadeiros e falsos ensinadores. "E até importa que haja entre vós heresias, para que os que são sinceros se manifestem entre vós" (1 Co 11.19). Aqueles que fazem parte dos eleitos, ou que são os verdadeiros filhos de Deus, não seguirão heresias. Cristo diz: "E, quando tira para fora as suas ovelhas, vai adiante delas, e as ovelhas o seguem, porque conhecem a sua voz. Mas, de modo nenhum, seguirão o estranho; antes, fugirão dele, porque não conhecem a voz dos estranhos. As minhas ovelhas ouvem a minha voz, e eu conheço-as, e elas me seguem; e dou-lhes a vida eterna, e nunca hão de perecer, e ninguém as arrebatará das minhas mãos" (Jo 10.4,5,27,28).

Porém, aqueles que não são verdadeiros crentes não ouvirão e não ouvem, não conhecem a voz de Cristo, nem o seguem. "Mas vós não credes, porque não sois das minhas ovelhas, como já vo-lo tenho dito" (Jo 10.26).

11. O oitavo capítulo da epístola aos Romanos parece esclarecer a questão, ou, antes, é de si mesmo uma prova clara da doutrina que estamos examinando. Precisamos ler todo o capítulo e ponderar, em oração, para que possamos apreender claramente o escopo do ensino do apóstolo sobre esta matéria. No sétimo capítulo, ele permaneceu descrevendo uma experiência legal e representando-a. Paulo inicia o oitavo capítulo afirmando:

"Portanto, agora, nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus, que não andam segundo a carne, mas segundo o espírito. Porque a lei do Espírito de vida, em Cristo Jesus, me livrou da lei do pecado e da morte. Porquanto, o que era impossível à lei, visto como estava enferma pela carne, Deus, enviando o seu Filho em semelhança da carne do pecado, pelo pecado condenou o pecado na carne, para que a justiça da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito. Porque os que são segundo a carne inclinam-se para as coisas da carne; mas os que são segundo o Espírito, para as coisas do Espírito. Porque a inclinação da carne é morte; mas a inclinação do Espírito é vida e paz. Porquanto a inclinação da carne é inimizade contra Deus, pois não é sujeita à lei de Deus, nem, em verdade, o pode ser. Portanto, os que estão na carne não podem agradar a Deus. Vós, porém, não estais na carne, mas no Espírito, se é que o Espírito de Deus habita em vós. Mas, se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é dele. E, se Cristo está em vós, o corpo, na verdade, está morto por causa do pecado, mas o espírito vive por causa da justiça. E, se o Espírito daquele que dos mortos ressuscitou a Jesus habita em vós, aquele que dos mortos ressuscitou a Cristo também vivificará o vosso corpo mortal, pelo seu Espírito que em vós habita. De maneira que, irmãos, somos devedores, não à carne para viver segundo a carne, porque, se viverdes segundo a carne, morrereis; mas, se pelo espírito mortificardes as obras do corpo, vivereis. Porque todos os que são guiados pelo Espírito de Deus, esses são filhos de Deus. Porque não recebestes o espírito de escravidão, para, outra vez, estardes em temor, mas recebestes o espírito de adoção de filhos, pelo qual clamamos: Aba, Pai. O mesmo Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus. E, se nós somos filhos, somos, logo, herdeiros também, herdeiros de Deus e co-herdeiros de Cristo; se é certo que com ele padecemos, para que também com ele sejamos glorificados. Porque para mim tenho por certo que as aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser revelada" (Rm 8.1-18).

Aqui Paulo descreve o caráter dos verdadeiros crentes como distinto do caráter dos meros legalistas, dos quais anteriormente falara. Os verdadeiros crentes -- afirma -- são justificados; estão em Cristo Jesus; não andam segundo a carne, mas segundo o Espírito; a justiça da lei se cumpre neles, isto é, a lei está escrita em seus corações; possuem o Espírito de

Cristo, o Espírito de adoção; o Espírito testifica com o espírito deles que são os filhos adotivos de Deus: "E, se nós somos filhos, somos, logo, herdeiros também, herdeiros de Deus e co-herdeiros de Cristo... as aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser revelada". Paulo diz: "Porque, em esperança, somos salvos. Ora, a esperança que se vê não é esperança; porque o que alguém vê, como o esperará?" (Rm 8.24).

E então o apóstolo passa a observar o fundamento de sua esperança: "E da mesma maneira também o Espírito ajuda as nossas fraquezas; porque não sabemos o que havemos de pedir como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós com gemidos inexprimíveis. E aquele que examina os corações sabe qual é a intenção do Espírito; e é ele que segundo Deus intercede pelos santos" (Rm 8.26-27). Isto, observe, afirma ser verdadeiro em relação a todos aqueles que pertencem a Cristo, ou que sejam verdadeiros crentes. A respeito do Espírito, diz o seguinte:

(1) Que todos os cristãos possuem este Espírito.

(2) Que este Espírito testifica com o espírito dos cristãos que são filhos de Deus.

(3) Que o Espírito intercede pelos santos de acordo com a vontade de Deus, isto é, que Ele ora no interior de cada um, ou os anima a orar, e a orar de modo correto, por aquilo que é da vontade de Deus lhes garantir. Paulo então diz: "E sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados por seu decreto" (Rm 8.28). Aqui representa aqueles que amam a Deus, e aqueles que são chamados de acordo com o seu propósito, como sendo as mesmas pessoas; e afirma sabermos que todas as coisas trabalharão juntas para o seu bem. Ele observa este fato como sendo um segundo alicerce de esperança. E então passa a declarar como é que sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, que ele considera como sendo os mesmos eleitos, chamados de acordo com a eleição ou os propósitos de Deus. Paulo observa: "Porque os que dantes conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos" (Rm 8.29), isto é, o conhecemos porque somos predestinados para sermos conformes à imagem de seu Filho. Não é "se" eles o serão, mas "o serão", e portanto, todas as coisas devem diretamente ou indiretamente contribuir para este resultado. A seguir diz: "E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou" (Rm 8.30). Ou seja, além do mais temos um bom fundamento para esperança a partir do fato de que aqueles que Deus predestinou para serem conforme a imagem de seu filho são as mesmas pessoas que também chamou; isto é, às mesmas pessoas a quem predestinou para serem conforme a imagem de seu Filho e as chamou, a essas também justificou; e aquelas a quem predestinou, e chamou, e justificou, a elas, isto é, às mesmas pessoas, também glorificou.

Aqui então -- o apóstolo conclui -- existe um firme fundamento para a esperança da qual falara, cujas bases havia destacado. A partir daí, de modo próprio, passa a dizer, com espírito de triunfo:

"Que diremos, pois, a estas coisas? Se Deus é por nós, quem será contra nós? Aquele que nem mesmo a seu próprio Filho poupou, antes, o entregou por todos nós, como nos não dará também com ele todas as coisas? Quem intentará acusação contra os escolhidos de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os condenará? Pois é Cristo quem morreu ou, antes, quem ressuscitou dentre os mortos, o qual está à direita de Deus, e também intercede por nós." (Rm 8.31-34).

Aqui Paulo afirma: "Se Deus é por nós, quem será contra nós?" e então começa a destacar várias outras considerações que consolidam este fundamento de confiança. Todos aqueles que amam a Deus são seus eleitos. Deus os justifica, e quem é aquele que os condena? Deus é por eles, e quem será contra eles? Deus espontaneamente deu seu próprio Filho por todos, quanto mais lhes dará gratuitamente todas as coisas? Se Ele não poupou a seu próprio Filho, é claro que não recusaria aos eleitos qualquer outra coisa que ainda fosse necessária para lhes garantir a salvação. Além do mais, foi Cristo quem morreu, e ainda, quem tornou a viver, e intercede pelos santos. Sendo estas coisas assim, bem podemos inquirir:

"Quem nos separará do amor de Cristo? A tribulação, ou a angústia, ou a perseguição, ou a fome, ou a nudez, ou o perigo, ou a espada? Como está escrito: Por amor de ti somos entregues à morte todo o dia: fomos reputados como ovelhas para o matadouro" (Rm 8.35-36).

O apóstolo, então, de modo triunfante afirma: "Mas em todas estas coisas somos mais do que vencedores, por aquele que nos amou. Porque estou certo de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir, nem a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor!" (Rm 8.37-39).

Se Paulo, no capítulo 8, não resolve a questão da salvação de todos os santos, como é que ela poderia ser resolvida? Vamos em poucas palavras resumir o argumento, como aqui o apresenta:

Nós já somos salvos por antecipação, ou em esperança; e somente através da esperança, pois ainda não recebemos a nossa coroa. Os fundamentos desta esperança são: que estamos em Cristo Jesus, que temos o Espírito de Cristo, o Espírito de adoção. Não andamos segundo a carne, mas conforme o Espírito. O Espírito de Deus testifica que somos filhos e herdeiros de Deus. Ele intercede por nós de acordo com a vontade de Deus. Ele também sabe que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles chamados segundo o propósito de Deus. Aqueles que são chamados, isto é, efetivamente chamados, são chamados em conformidade com a sua predestinação, para serem conforme a imagem de Deus. Daí, aqueles que assim são predestinados, são chamados, justificados e glorificados. Portanto, ninguém pode intentar acusação contra os eleitos de Deus. Deus os justifica; quem, então, os condenará? Cristo morreu por eles, sim, antes, por eles ressuscitou e intercede a seu favor. Deus não poupou o seu próprio Filho, e é claro que não poupará, a favor dos cristãos, nada que seja essencial para lhes assegurar salvação. Por esta razão Paulo conclui que nada será capaz de nos separar do amor de Deus.

Eu sei que a este argumento, alguns têm respondido que, embora nada nos possa separar do amor de Deus, contudo, nós mesmos podemos nos separar deste amor. A isto respondo: é verdade; talvez o façamos, ou podemos fazê-lo. Porém a questão é, será que nós, ou alguns dos eleitos e chamados o faremos? Não, de fato; pois isto é o que o apóstolo pretendia afirmar, ou seja, a certeza da salvação de todos os verdadeiros santos. O apóstolo assume, ou afirma, com segurança, nesta passagem que todos aqueles que verdadeiramente amam a Deus são eleitos, ou são escolhidos para serem conforme a imagem de seu Filho; e são chamados, e santificados, e justificados, em conformidade com tal predestinação.

Se este não for o seu significado, qual será? Se não for isto que o apóstolo quis dizer, que fundamento de esperança nós, afinal, encontramos naquilo que ele diz? O apóstolo parece ter tido em mente o mesmo pensamento, quando escreveu aos Hebreus:

"Pelo que, querendo Deus mostrar mais abundantemente a imutabilidade do seu conselho aos herdeiros da promessa, se interpôs com juramento, para que por duas coisas imutáveis, nas quais é impossível que Deus minta, tenhamos a firme consolação, nós, os que pomos o nosso refúgio em reter a esperança proposta; a qual temos como âncora da alma segura e firme e que penetra até ao interior do véu, onde Jesus, nosso precursor, entrou por nós, feito eternamente sumo sacerdote, segundo a ordem de Melquisedeque" (Hb 6.17-20).

Existem muitas outras passagens nas Escrituras com a mesma importância daquelas que citei como apoio a esta doutrina, e cada um deve saber como tomar o problema e examiná-lo para si mesmo. Mas já tenho buscado esta investigação e levado-a longe o bastante. Se aquilo que já foi dito fracassar em satisfazer o pensamento de alguém, presumo que nada daquilo que poderia ser adicionado produziria a convicção. Portanto, após responder a algumas objeções que se seguirão, considero concluída a discussão do assunto.

1 Na edição de 1878, este é o início de uma nova aula intitulada: "A Prova da Perseverança dos Santos ".

 

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